"…não se compreende a ausência de um certo número de garantias sociais… Acho que são coisas cuja exigência irá até aumentar. É nesse sentido que eu sou marxista. Não tenho uma concepção dogmática, fechada, muito definida doutinariamente, mas simplesmente um sentido humano de solidariedade que me leva a verificar que a luta de classes é uma realidade, e a estar sempre com aqueles que estão na mó de baixo.
“Há um autor português que exerceu muita influência em mim, na minha geração. Trata-se de António Sérgio, que fazia essa distinção muito clara entre o liberalismo económico, que é a concorrência, a caça ao lucro e o liberalismo político, que é a defesa das liberdades essenciais. Essas duas coisas acho que são coisas diferentes.
“…estava a ensinar Português dos primeiros anos, visto desde 53 me encontrar proibido de ensinar Literatura, História e Filosofia, só podia ensinar Latim, Grego ou Português dos primeiros anos, de cursos que equivalem à quinta ou sexta classe. Nessa altura eu interessei-me em fazer uma experiência pedagógica que aproximava o ensino do Português do ensino da Matemática. O ensino da Matemática passou a ter carácter diferente. Ensinavam-se as chamadas Matemáticas Modernas, ou a Teoria dos Conjuntos. Eu, desde os anos quarenta e tal, estava convencido que era possível ligar certas disciplinas matemáticas com certos aspectos da gramática e, portanto, dediquei-me a essa experiência e, para o fazer ao nível mais elementar, pedi para ir para a Escola Gomes Teixeira, que era uma Escola Preparatória. Consegui isto em 67, já no tempo de Marcelo Caetano, e era Ministro da Educação o José Hermano Saraiva, meu amigo pessoal. Fiz um requerimento, é claro que não meti cunha nenhuma embora seja amigo dele, e fiz essa experiência.”
“Essas imagens de miséria da classe piscatória exerceram também uma grande influência moral e ideológica em mim. Senti-me desde muito cedo revoltado por essa camada popular, sobretudo de pescadores que viviam na miséria, com grandes dificuldades, especialmente quando surgia um temporal imprevisto para as condições desse tempo, em que não era possível pescar – e na altura das pescas morria-se muito frequentemente afogado, para não se morrer de fome.”