Trabalho
Sobre o brutal aumento do desemprego e os crescentes abusos de direitos à boleia da crise
A variação de 20% no número de desempregados do distrito do Porto (números do primeiro trimestre de 2009 face ao período homólogo de 2008) evidencia as consequências cada vez mais graves das políticas que convergem nesta crise: muitos anos de desinvestimento público, destruição do aparelho produtivo nacional, falta de apoio às PME´s, política de baixos salários e diminuição de direitos laborais. Estas são algumas das razões estruturais que vão acentuando o fosso crescente entre a taxa de desemprego nacional, que se cifra em 9.8%, e a taxa de desemprego no distrito do Porto, que ascende aos 12,5%.
Destes últimos anos esperava-se a necessária inversão de políticas que ajudasse a superar a crise que atravessamos, no entanto assistimos a mais das mesmas velhas soluções que nos trouxeram aonde estamos hoje.
Mas sob o pretexto da crise temos vindo a assistir a várias situações que merecem a nossa mais viva condenação.
Assistimos a um anormal número de encerramentos de empresas que levantam dúvidas sobre a necessidade de tal desfecho.
Assistimos à redução do quadro de pessoal das empresas, quase sempre acompanhada de uma maior carga de trabalho para os trabalhadores que permanecem ao serviço.
Assistimos à degradação salarial, como é o caso na generalidade das empresas do sector das pedreiras na região do Vale do Sousa e Baixo Tâmega, entre outras.
Empresas acumulam lucros e despedem
Um exemplo de como a ganância de poucos atira muitos para o desemprego foi o caso da Movelpartes, uma empresa do grupo Sonae em Paredes que fez um despedimento colectivo de 42 trabalhadores sem qualquer justificação.
Situação semelhante pode encontrar-se na ARA (que teve lucros superiores a 1,5 milhões de euros em 2007) que vai encerrar as instalações em Vila Nova de Gaia, atirando para o desemprego mais 160 trabalhadores.
Salário por pagar e a desculpa da crise
De referir ainda o caso da Tsuzuki, em Vila do Conde, que anunciou publicamente o fim dos problemas, a retoma normal da produção e até admitiu reforço do numero de trabalhadores, mas continua a pagar faseadamente os salários e com atraso.
Na quase totalidade das situações em que ocorrem despedimentos ou encerramentos, o desprezo pela lei e pelos direitos dos trabalhadores é completo.
Damos como exemplo o caso da Tarik, empresa de vestuário de Lousada que encerrou no passado dia 23 de Março sem pagar o mês de salário de Março e entregando às trabalhadoras o impresso para o subsídio de desemprego que já tinha preenchido desde o final do mês Fevereiro, demonstrando que conscientemente se aproveitou das trabalhadoras para acabar uma encomenda sem ter intenção de lhes pagar.
Em Paços de Ferreira uma trabalhadora da Cunha & Alves, empresa têxtil, recebeu uma carta de despedimento que invocava precisamente o argumento da conjuntura e da crise, dizendo em síntese que “como o pais está em crise, ficas despedida a partir do final deste mês”.
A situação que se vive na empresa Ladário- Confecções Lda, sita em Paredes, é de uma enorme gravidade e exige que se tomem medidas para salvaguardar os interesses e os direitos dos trabalhadores. Na verdade, esta empresa já tinha sido notícia pelo facto de, na altura, se suspeitar de uma suspensão de contratos de trabalho que incluía cinco trabalhadoras grávidas. Esta denúncia levou à acção da ACT.
Acontece que a situação que se vive na empresa é hoje ainda mais grave. Esta empresa tem os salários dos cerca de 100 trabalhadores em atraso desde Janeiro do corrente ano e, de acordo com informações recebidas pelo Grupo Parlamentar do PCP, recentemente o dono desta empresa levantou o dinheiro que existia e fugiu, estando agora em parte incerta. Face a esta situação, os trabalhadores reagiram e estão em constante vigília à porta da empresa. Durante o dia e a noite os trabalhadores estão a proteger o património da empresa para salvaguardar os seus direitos.
Empresas não pagam o Salário Mínimo Nacional
Podíamos proporcionar exemplos de empresas que pura e simplesmente não actualizaram o SMN: Inarbel (salário de €410), Raite (salários de €426), Rosa Têxtil (salário de €426 às mulheres e de €450 aos homens), Confecções Xavier (salário de €426, Cofibem (salário de €426), Coelho e Nunes (Salário de €426), entre muitos outros casos.
Recurso abusivo ao Lay-Off
Há ainda empresas que recorrem abusivamente ao Lay-Off:
1. Miguel Muns Piy (Oliveira do Douro, cerca de 40 trabalhadores): lay-off rotativo entre os trabalhadores que permite trabalhar todos os dias e manter a produção reduzindo os custos para a empresa porque deixa de pagar parte significativa dos salários;
2. Razajo (Gueifães, cerca de 35 trabalhadores): iniciou lay-off este mês, ficou apenas com 6 trabalhadores. Contudo, recebeu uma encomenda e já chamou os trabalhadores em lay-off. O abuso do recurso ao lay-off permite a estes patrões recorrerem a esta medida para reduzir custos caso haja uma redução de encomenda, mesmo que seja por uma semana. O problema é que os trabalhadores não podem fazer lay-off dos sacrifícios por que passam.
Exigem-se medidas - Os trabalhadores não podem continuar a ser os únicos a suportar a crise
É urgente pôr cobro a estas práticas ilegais e profundamente reprováveis, sob pena de corrermos o risco de assistir a uma generalização deste fenómeno, que já afecta muitos milhares trabalhadores, mesmo que indirectamente, uma vez que o ambiente criado nas empresas é propício a que seja aumentada a pressão e chantagem, forçando ritmos de trabalho impossíveis de manter e a redução de salários.
O PCP considera que perante este cenário é inadmissível que a Autoridade para as Condições de Trabalho se vá remetendo a um papel que é cada vez mais de uma entidade observadora e reguladora. É urgente dotar a ACT com os meios necessários para uma melhor intervenção no terreno e corrigir esta postura de acantonamento e de priorização do trabalho burocrático.
O caminho para vencer a crise nunca poderá ser a redução do emprego e a retirada de direitos aos trabalhadores! Uma outra política, uma política de esquerda ao serviço do povo e do país é possível e necessária.
Mais que nunca é preciso uma mudança de política que valorize os salários, proteja os desempregados e aposte na defesa do aparelho produtivo nacional e na defesa do emprego com direitos. São necessárias medidas do governo para que os trabalhadores em lay-off não sejam penalizados no salário. Se há apoios financeiros para os patrões também tem que haver garantias para os trabalhadores.
Porto, 30 de Abril de 2009
Participaram nesta Conferência de Imprensa:
José Pedro Rodrigues e Silvestrina Silva, da DORP do PCP
Jaime Toga, responsável da Organização Regional do Porto do PCP