intervenção de Ilda Figueiredo,
deputada do PCP no PE
A intensa crise do capitalismo que estamos a viver e para a qual também contribuíram as orientações, políticas e medidas económico-sociais tomadas no plano da União Europeia, e agravadas pelos governos portugueses, estão a ter graves consequências no plano social.
Como sempre acontece nestas crises, quem mais sofre são os trabalhadores e as populações mais carenciadas. Mesmo os números oficiais já não podem esconder a gravidade da situação. Por exemplo, os últimos dados do Eurostat confirmam as dramáticas consequências sociais da crise a nível da União Europeia. A taxa de desemprego subiu na União Europeia a 27 para 9,3% e na zona euro estava em 9,8%. Isto significa que temos, hoje, mais de 22,5 milhões de desempregados na União Europeia, quando, há um ano, o mesmo Eurostat apontava 17,5 milhões de desempregados. No espaço de um ano o desemprego aumentou 28,5% a nível comunitário, tendo arrastado para o desemprego mais cinco milhões de trabalhadores.
Como se sabe, em Portugal a taxa desemprego de que o Eurostat fala -10,2% em Outubro passado - é uma das mais elevadas da União Europeia, dado que acima de nós apenas se situavam quatro países – Eslováquia, Irlanda, Espanha e Letónia. De acordo com esta informação, haveria em Portugal cerca de 570 mil desempregados, embora o número real se situe em mais de 700 mil desempregados, pois é necessário incluir, por exemplo, os desempregados que no último mês desistiram de procurar trabalho e outros considerados “inactivos disponíveis” ou que apenas fazem pequenos biscates para sobreviver, o que poderá significar uma taxa efectiva de desemprego superior a 12%, com a agravante de, cerca de metade, não estar a receber subsídio de desemprego, tendo falhado, até agora, todas as tentativas que o PCP fez para alterar esta situação, através de projectos-lei apresentados na Assembleia da República.
Entretanto, como para criar emprego é fundamental haver crescimento económico, as perspectivas existentes, seja a nível da média da União Europeia, seja de Portugal, demonstram o agravamento de toda esta situação a curto prazo. Por exemplo, quer as previsões da Comissão Europeia, quer as da OCDE consideram que a quebra do PIB, em 2009 terá atingido perto -3% e só terá algum muito pequeno crescimento em 2010, que será inferior a 1%, e em 2011 rondará 1% a 1,5%, o que será manifestamente insuficiente para criar emprego e reduzir o desemprego.
Ora, toda a situação económica e social é ainda mais grave aqui no Norte, uma das zonas mais pobres da União Europeia, onde a liberalização do comércio internacional demonstrou que a aposta em indústrias e sectores que prosperaram com base em salários baixos é um desastre económico e social, intensificado com outras políticas comuns que, no plano comunitário, com conivência dos governantes e deputados portugueses do PS, PSD e CDS/PP, esqueceram as especificidades da nossa economia regional, designadamente nas áreas da agricultura, das pescas e da indústria de sectores como o têxtil, o calçado, as madeiras, cutelaria, material eléctrico, cerâmica, metalurgia e tantos outros, onde predominam micro e pequenas e médias empresas asfixiadas por políticas financeiras, fiscais e de redução do poder de compra da população. A esta situação junta-se a estratégia das multinacionais de deslocalização e abandono da sua actividade em Portugal, designadamente no Norte, sempre na busca de dumping social e de maiores lucros
Assim, todos compreendem que a saída da crise exige uma ruptura com as políticas que estiveram na origem desta situação e uma mudança de fundo nas orientações e nas medidas existentes. Mas não é essa a disposição dos responsáveis da União Europeia, como o demonstra a recente entrada em vigor do Tratado de Lisboa, que visa o aprofundamento da integração capitalista, militarista e federalista da União Europeia, ou seja, das medidas que estiveram na origem desta crise.
Por isso, tem de passar pela luta dos trabalhadores e dos povos dos diversos Estados-Membros, com o apoio das forças progressistas e revolucionárias, a ruptura e a mudança que se impõem.
Entretanto, a Comissão Europeia acaba de lançar uma consulta pública, até 15 de Janeiro, sobre a futura estratégia “EU 2020”, onde reconhece que “há décadas que a Europa não vivia uma crise económica e financeira tão profunda, com uma contracção económica tão acentuada, em que a taxa de desemprego deve atingir os dois dígitos em 2010, o nível mais elevado dos últimos dez anos”. Só que se esqueceu de acrescentar que há dez anos lançou a chamada estratégia de Lisboa onde afirmava que, em 2010, a União Europeia seria o espaço económico e do conhecimento mais avançado do mundo, a caminhar para o pleno emprego e a diminuir a pobreza. Para isso apostava nas liberalizações e privatizações de sectores e serviços públicos e na flexibilidade laboral. Como então dissemos, tal estratégia só podia acabar no agravamento de todos os problemas sociais. Lamentavelmente, foi isso que aconteceu.
Então, impõe-se insistir, já no imediato, numa mudança profunda, que dê prioridade à criação do emprego com direitos, à valorização do trabalho, que aposte na defesa dos sectores produtivos e na melhoria do poder de compra e das condições de vida da população, através de uma justa repartição da riqueza, de melhores e mais serviços públicos de qualidade, de novas políticas que incentivem a produção, os micro, pequenos e médios empresários, agricultores e pescadores.
Tudo isto exige outras políticas nos planos comunitário, nacional e regional, de que destaco a aposta em medidas orçamentais e fiscais que dêem expressão prática ao princípio da coesão económica e social, para que Portugal e o Norte não continuem a divergir da média comunitária. O que também pressupõe o fim do Pacto de Estabilidade, da estratégia de Lisboa, das desregulamentações e liberalizações e a sua substituição por uma verdadeira estratégia de desenvolvimento e progresso social.
É por tudo isto que vamos continuar a lutar também no Parlamento Europeu.