Importa por isso sublinhar o seguinte:
1. O Presidente Guilherme Pinto convocou uma reunião extraordinária da Câmara para 2ª feira, dia 15 de Setembro, com a finalidade de debater o teor do relatório da IGF atrás referido. Ao Vereador ao PCP só foi entregue uma cópia do documento no dia 10 de Setembro, 5ªa feira, ou seja, um dia depois de uma conferência de imprensa na qual o Presidente do Município e a gestão do PS tornaram pública, em nome da Câmara, a sua versão sobre as conclusões da auditoria. É, no mínimo, um acto sem transparência e totalmente destituído de ética, revelando uma evidente falta de respeito democrático pelos direitos da oposição municipal.
2. Com esta jogada de antecipação, e a divulgação de uma versão partidária e unilateral, a gestão PS visa amortecer as consequências políticas provocadas pelo conteúdo da auditoria, tentando esconder e passar uma esponja sobre as conclusões - absolutamente demolidoras - da auditoria da IGF à gestão urbanística do Município de Matosinhos. É para impedir que isso ocorra que o PCP realiza este encontro com a Comunicação Social, facultando sempre as cópias das partes relevantes do relatório que suportam as afirmações que fazemos. Assim, e como resultado da análise de uma amostra de (apenas) 14 operações urbanísticas licenciadas no Concelho entre 2003 e 2006, destacam-se, nomeadamente, as seguintes conclusões da IGF:
2.1. 57% das operações auditadas (8 em 14) desrespeitam o PDM, pelo que as respectivas licenças são consideradas nulas. Das oito operações violadoras do PDM, quatro são licenciamentos de loteamentos (em oito operações de loteamento analisadas) e quatro são licenças de edificações, (das seis auditadas nesta vertente);
2.2. Só em duas das operações urbanísticas analisadas verifica-se um benefício financeiro adicional rondando os 810 mil euros para os promotores imobiliários, como resultado de um licenciamento suplementar de 3432 m2;
2.3. 71,4% das operações auditadas (10 em 14) apresentam erros de cálculo da Taxa Municipal de Urbanização (TMU), os quais se traduziram em prejuízo financeiro do município no valor líquido global de 107,4 mil euros (109,4 em benefício dos promotores, 1,9 mil em seu prejuízo…);
2.4. A quase totalidade das operações urbanísticas auditadas, (13 em 14, páginas 16 e 26), revelam prejuízos financeiros para o município de 1,360 milhões de euros, como resultado de irregularidades na liquidação e no pagamento das compensações legais devidas ao município pelas operações urbanísticas;
2.5. No seu contraditório, a Câmara afirma que só vai promover liquidações adicionais e restituições em relação aos erros que não têm natureza sistemática, o que significa que, em síntese, a Câmara tenciona abdicar de receitas no montante total de cerca 1,3557 milhões de euros;
2.6. Os regulamentos municipais relevantes, nomeadamente o do PDM, contêm conceitos indeterminados que potenciam diferentes interpretações, instabilidade e incerteza na respectiva aplicação.
3. A auditoria da IGF permite ainda confirmar que:
3.1. Das 32 zonas do Concelho cujo uso, previsto no PDM (aprovado em 1992), deveria ter sido sujeito à elaboração e aprovação prévia de Planos de Urbanização (PU) ou/e de Planos de Pormenor (PP), a Câmara só realizou, aprovou e submeteu a ratificação um PU (em Leça da Palmeira) e dois PPs (Rua de Santana, Leça do Balio e quarteirão de Gist Brocades, Matosinhos, tendo um outro PP, na Zona de Azenhas de Cima, sido ratificado ainda antes de 1992).
Mais nenhum dos PUs ou dos PPs previstos no PDM – muitos dos quais a Câmara utiliza em operações de urbanização, “independentemente da sua eficácia jurídica e da sua conformidade com o PDM” -, foram (ou estão) concluídos, aprovados e ratificados por iniciativa municipal. E se alguns outros foram ratificados, isso deve-se – inteiramente – ao facto de integrarem áreas do Plano de Ordenamento da Orla Costeira, concluído há já alguns anos pela Administração Central.
Dezasseis anos após a aprovação do PDM que impunha a elaboração e aprovação daqueles PUs e PPs, pode dizer-se que esta determinação não obrigava os órgãos municipais, (como argumenta falaciosamente a Câmara no seu contraditório); só que, então, também teria que ser verdade que sem o cumprimento dessa obrigação nada podia ser urbanizado fora das regras do PDM nas áreas abrangidas – muito menos através da invocação, “ à la carte”, de planos de urbanização e de pormenor em elaboração mas sem qualquer eficácia legal. Mas não foi isto que sucedeu, como demonstra à saciedade o relatório da IGF;
3.2. Consequentemente, 5 das 8 nulidades detectadas nas 14 operações urbanísticas auditadas, ocorreram por causa da “imposição do cumprimento de planos de urbanização ineficazes, em detrimento do cumprimento do PDM em vigor (artigos 10º e 11º)”;
3.3. A título de exemplo, e “porque abrangem operações urbanísticas analisadas no âmbito da presente auditoria”, referenciam-se três zonas (a zona de Matosinhos Sul, os quarteirões a norte da Av. da República e a zona da frente urbana da Circunvalação), … onde, apesar do uso se encontrar sujeito à prévia elaboração de Plano de Urbanização ou Pormenor, “foram aprovadas várias operações urbanísticas sem planos eficazes de enquadramento, no período compreendido entre a publicação do PDM (1992) e a alteração ao artigo 10º do seu Regulamento (2002)” (pág 5, anexo 1);
3.3. Quanto ao controlo do crescimento urbano, a gestão urbanística tem provocado:
. uma “grande densificação de algumas áreas de reconversão e/ou expansão urbana”;
. ” baixa taxa de cobertura da rede pública de abastecimento de água (apenas 47% da população se encontra servida com rede pública de abastecimento de água”, 78103 habitantes servidos de um total de 167026 habitantes no Concelho, censos 2001, conforme resposta da própria CM ao inquérito da DGOTDU sobre avaliação da execução dos PDMs em vigor…), e da rede pública de drenagem de águas residuais (“apenas 33% da população se encontra servida pela rede pública de drenagem de esgotos”, 54 672 habitantes do mesmo universo de 2001, conforme resposta da CM ao atrás citado inquérito);
. “carência de áreas para equipamentos e espaços verdes”;
. “défice de serviços locais e equipamentos de apoio nas freguesias periféricas do Concelho”.
4. O PCP sublinha o facto das 14 situações analisadas no âmbito da inspecção da IGF constituírem uma pequeníssima amostragem das situações existentes na área da gestão urbanística no Município de Matosinhos.
A percentagem de nulidades de licenciamento constatadas (57%), e a dimensão e a relevância dos erros cometidos em prejuízo global das receitas municipais (em 92,8% das situações analisadas, provocando um saldo negativo de 1,355 milhões de euros, em 13 dos 14 casos verificados) mostra o verdadeiro estado da política urbanística da Câmara de Matosinhos, pelo menos nos últimos dezasseis anos.
Não há qualquer operação de cosmética, (ou de propaganda), capaz de esconder as evidências. Nomeadamente as seguintes:
4.1. A política urbanística na Câmara Municipal de Matosinhos – além da exiguidade de recursos humanos, como também assinala o relatório da IGF – está vocacionada para responder aos interesses particulares de grandes grupos imobiliários, maximizando-lhes mais-valias e diminuindo-lhes os custos das suas propostas de intervenção urbanística.
4.2. A política urbanística na Câmara Municipal gere a ocupação do território à medida desses interesses, de forma casuística, usando instrumentos de gestão que na quase totalidade não tem qualquer eficácia, (já que nunca foram aprovados pela Assembleia Municipal nem ratificados pelo Governo, ou estão em mera elaboração), mas que servem perfeitamente para “aumentar as áreas de construção permitidas pelo PDM em vigor”. De forma ilegítima, acrescente-se.
5. Este relatório vem dar razão às afirmações e dúvidas levantadas em Maio de 2006 pelo PCP, quando publicamente afirmou que o Plano de Urbanização de Matosinhos Sul não tinha eficácia legal nem podia ser usado para licenciar operações urbanísticas que ultrapassassem as regras do PDM.
Dissemos na altura que tínhamos fortes suspeitas de que muitas das operações urbanísticas aí realizadas não respeitavam o PDM em vigor e solicitámos então uma intervenção da IGAL, que aliás ainda decorre. Hoje, e por antecipação, as conclusões do relatório da IGF vêm dar toda a razão às dúvidas então levantadas pelo PCP. Seria altura do actual Presidente da Câmara, que na altura ofendeu política e até pessoalmente o Vereador do PCP – acusando-o de mentir, e de não poder provar as afirmações – reconhecer que errou e que não tinha razão.
Só não podíamos adivinhar que o que se passava (e continua a passar) em Matosinhos Sul tinha também sucedido (e continua a suceder) noutras áreas do Concelho abrangidas por PUs ineficazes, sem aprovação pela AMunicipal nem ratificação governamental (quarteirões a norte da Av. Da República, frente urbana da Circunvalação, entre outros casos).
6. Face ao conjunto de conclusões, recomendações e propostas apresentadas pela IGF, o PCP entende e propõe que:
6.1. O relatório deve ser submetido à analise e investigação da Procuradoria-Geral da República e do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, nomeadamente para eventual apuramento de responsabilidades individuais;
6.2. A Câmara deve seguir todas as observações e recomendações para passar a determinar de forma rigorosa o valor das TMU e para passar a incorporar de forma integral e plena os elementos que tem que ser atendidos para a determinação do valor das compensações devidas ao município;
6.3. A Câmara não deve abdicar de liquidar todas as importâncias em dívida no âmbito das operações urbanísticas alvo da auditoria, sejam as que já terminaram sejam as que ainda decorrem (e algumas delas estão mesmo longe de estarem concluídas, como são o caso da EFANOR e do empreendimento situado no gaveto poente do cruzamento da Avenida Afonso Henriques com a Estrada da Circunvalação). Julgamos mesmo que este será um procedimento obrigatório que o Tribunal Administrativo e Fiscal não deixará de impor;
6.4. A Câmara deve proceder de imediato à reconfirmação do cálculo da TMU e das compensações em todas as operações, com significado e relevância, de loteamento e edificação licenciadas desde a aprovação do PDM de Matosinhos e, em função dos resultados proceder à liquidação dos presumíveis valores em dívida;
6.5. A Câmara deve proceder com urgência à aprovação (nomeadamente pela Assembleia Municipal) e à ratificação de todos os PUs e PPs com condições para tal;
6.6. Até que isso suceda, a Câmara não pode insistir no erro e na tomada de decisões nulas e sem eficácia, abstendo-se assim de usar esses instrumentos de gestão urbanística para licenciar operações urbanísticas ao abrigo de PUS e/ou PPs sem eficácia legal e com regras que não respeitem o regulamento do actual PDM.
Honório Novo, Vereador do PCP
José Pedro Rodrigues, membro da Assembleia Municipal
Matosinhos, 15 de Setembro de 2008