Pobreza e exclusão social
Cria um Plano de Emergência Social no Distrito do Porto
A pobreza e a exclusão social são uma triste realidade nacional. Os recentes dados do relatório conjunto sobre a protecção social e inclusão social, apresentado ao Conselho de Ministros do Emprego e Segurança Social da União Europeia, revelam que em Portugal há mais de 20 por cento de crianças expostas ao risco de pobreza, sendo Portugal apenas ultrapassado pela Polónia. Este relatório refere ainda que existe um elevado risco de pobreza entre os trabalhadores, o que resulta dos salários de miséria que se praticam em Portugal, realidade que o Governo PS não parece querer combater.
Se é verdade que a pobreza e a exclusão social não são um fenómeno novo, e por isso também da responsabilidade do PSD e do CDS, é igualmente verdade que a análise dos dados estatísticos e uma atenta observação da realidade social em que vivemos, demonstram que estes fenómenos estão a agravar-se para níveis extremamente preocupantes graças às opções políticas do actual Governo PS.
As recentes “reformas da Segurança Social”, ao invés de combaterem as pensões de miséria que existem em Portugal, vieram perpetuar e até agravar a insustentável situação de miséria social em que muitos milhares de trabalhadores reformados vivem, hipotecando a dignidade e autonomia daqueles trabalhadores que passam hoje à situação de reformados e pondo em causa o direito à segurança social e à atribuição das prestações sociais como direitos aos actuais trabalhadores.
O DISTRITO DO PORTO
Sendo a pobreza e a exclusão social uma preocupação nacional, tendo o PCP um conjunto de propostas e um projecto político que propõem a construção de uma sociedade mais justa e onde a distribuição da riqueza criada se faça de uma forma mais equitativa, a verdade é que a realidade vivida no Distrito do Porto tem contornos particularmente graves merecendo não só uma análise detalhada, mas também um conjunto de propostas que permitam combater, ou pelo menos mitigar, as consequências no distrito da política neo-liberal levada a cabo por sucessivos Governos, com particulares responsabilidades no actual Governo PS.
As opções políticas do Governo do PS - a obsessão pelo défice, a manutenção de um modelo de desenvolvimento assente em baixos salários, encerramento de serviços públicos, precariedade laboral, quer na Administração Pública quer no sector privado, a manutenção e agravamento das pensões de miséria e o desinvestimento no distrito do Porto - acentuaram as assimetrias já existentes, aumentaram a já injusta distribuição da riqueza e conduziram a um aumento significativo dos números do desemprego neste distrito.
Estas opções políticas fizeram disparar todos os indicadores da pobreza no Distrito do Porto. Mas além da análise estatística, que demonstra a situação de emergência social que se vive no Distrito, o contacto que PCP promove com associações, IPSS, colectividades e com os sindicatos, entre outros, confirmam este cenário e reforçam a necessidade da criação de um plano de emergência social no distrito do Porto.
PRINCIPAIS CAUSAS DA POBREZA E EXCLUSÃO SOCIAL NO DISTRITO DO PORTO
1. O Programa de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC) desempenha um importantíssimo papel na dinamização do desenvolvimento económico e social.
Em relação ao distrito do Porto, o PIDDAC de 2008 representou, relativamente ao de 2007, uma redução de 13%. Se tivermos como referência o PIDDAC de 2005 então o PIDDAC de 2008 representou uma diminuição de 77% no investimento público.
Devido à crise económica e à falta de investimento público, a região norte tinha já em 2005 o mais baixo PIB do país (59,8% da média comunitária). Esta região é mesmo uma das regiões (NUTs II) mais pobres da União Europeia a 27. Acresce que, da análise dos dados sobre o poder de compra concelhio per capita, referentes ao ano de 2005, publicados pelo INE em 2007, é de salientar que dos dezoito concelhos que compõem o distrito do Porto, quinze apresentam um índice médio abaixo da média nacional. A título de exemplo o poder de compra per capita no concelho de Penafiel é de 62,68%, em Amarante é de 60,97%, em Marco de Canaveses é de 60,2% e em Baião é de 49,26% da média nacional.
Se o Governo tivesse em conta a grave crise económica e social que se vive no Porto teria, necessariamente, reforçado o investimento público no distrito.
Só com este reforço, em termos muito substanciais, será possível dotar o distrito de infra-estruturas essenciais para aumentar a competitividade económica regional e para melhorar a qualidade de vida das populações, eliminando os persistentes atrasos relativos existentes num distrito cujas potencialidades humanas e físicas lhe conferem um papel essencial para permitir o desenvolvimento coeso e sustentável de todo o País.
Só com um esforço suplementar no plano do investimento público será possível o reforço, em quantidade e qualidade, da rede de serviços públicos essenciais para garantir a melhoria da qualidade de vida, seja na saúde, na educação, na segurança social, na justiça ou na segurança pública.
Só o reforço substancial do investimento público – sobretudo em momento de acentuada crise económica e social – poderá igualmente servir como catalisador para o aumento do investimento global no distrito, a dinamização e modernização do vasto tecido das micro, pequenas e médias empresas com actividade na região, condições indispensáveis para aumentar a riqueza produzida e permitir combater de forma sustentada o elevado nível de desemprego existente no distrito. Contudo, o que tem acontecido é precisamente o contrário. Anos após ano, sucessivos Governos, têm reduzido o investimento directo do Estado no distrito agravando a crise económica e social.
Noutro plano, o País, em termos gerais e o distrito do Porto, por maioria de razão, estão a sofrer as consequências negativas provocadas pelo enorme (e não compreensível, nem aceitável) atraso no lançamento do Quadro de Referência Estratégica Nacional (QREN 2007-2013). Sem prejuízo do quadro normativo e regulamentar existente - e das duvidas fundamentadas que temos genericamente colocado quanto ao nível de descentralização, de participação e da definição de prioridades – coloca-se a necessidade da sua eventual readaptação às situações concretas, importando que os meios financeiros disponibilizados não passem à margem do combate e superação da situação de emergência social que hoje se vive no distrito.
2. Da análise dos salários médios do nosso país percebemos que o distrito do Porto tem um salário médio de 742 euros quando a média nacional é de 785 euros, num quadro de uma profundamente injusta distribuição da riqueza que se verifica por todo o país, também como resultado de um crescimento económico claramente desigual e assimétrico.
Num distrito caracterizado por um tipo de trabalho intensivo, com uma estrutura produtiva maioritariamente centrada nas baixas qualificações e nos baixos salários, com empregos na indústria e no comércio onde a precariedade se substitui cada vez mais aos vínculos estáveis, o desemprego não pára de crescer, sendo um dos mais claros sinais da grave crise económica e social deste distrito.
O desemprego, pelos impactos sociais que tem é um dos principais responsáveis, justamente com os salários e pensões de miséria, pela pobreza e exclusão social no nosso país.
A taxa de desemprego na região Norte situa-se nos 9,4%1, bem acima da média nacional que se situa nos 8%. Estes dados, que não têm em conta os inactivos e os desempregados desmotivados, revelam que 41% dos desempregados a nível nacional se encontram na região norte.
Se no ano de 2000 existiam na Região Norte cerca de 76 mil desempregados, no ano de 2007 existiam já cerca de 186 mil desempregados. O desemprego, entre 2000 e 2007 aumentou na Região Norte mais de 144%.
A Região Norte é assim a região do país que tem o maior número de desempregados e dentro desta região, foram as sub-regiões do Vale do Ave e de Entre o Douro e o Vouga que mais contribuíram para o aumento do desemprego. A sub-região grande Porto tinha 39% do desemprego.
Os elevadíssimos índices de desemprego registados no distrito do Porto são assim causa de efectiva preocupação que exigem a tomada de medidas que combatam esta situação. A existência de concelhos, como o de Santo Tirso, que registam taxas de desemprego superiores a 16% (o dobro da média nacional) demonstra a necessidade de adopção de políticas públicas que combatam a pobreza e a exclusão social a que muitos destes desempregados ficam sujeitos, que criem verdadeiras alternativas e emprego com direitos.
Tendo em conta este cenário, não é surpreendente, pois, que o distrito do Porto tenha o mais elevado número de beneficiários do subsídio de desemprego, cerca de 57 mil no mês de Dezembro de 2007.
Na Região Norte, o total de desempregados a beneficiar do subsídio de desemprego rondava os 94 mil trabalhadores. Se tivermos em conta que o desemprego no 4.º trimestre de 2007 atingia já 186 mil pessoas nesta mesma região, constatamos o elevadíssimo número de desempregados que não tem direito a este subsídio, encontrando-se assim numa situação de elevado risco de pobreza.
3. Quando às pessoas idosas, o Porto, com cerca de 245 mil reformados por velhice, é o segundo distrito com mais reformados, cuja pensão média é de 390 euros, portanto, inferior ao salário mínimo nacional. Acresce que, no que diz respeito às mulheres reformadas a situação agrava-se, uma vez que estas recebem em média apenas cerca de 60% da pensão dos homens.
Apesar das medidas propagandísticas do Governo PS que, com alegada preocupação social, pretendem alargar a rede de equipamentos sociais, a verdade é que essa aposta tem sido no contínuo e preocupante desinvestimento na rede pública. É emblemática a existência de apenas um lar de idosos da rede pública na cidade do Porto. O Governo desresponsabiliza-se, transferindo esta função social para os privados e para a rede solidária, sendo que na grande maioria dos casos, as famílias não têm rendimento para suportar os preços exigidos para o acesso a estes equipamentos.
Assim, a praticamente inexistente rede pública de equipamentos sociais no distrito do Porto, as baixas pensões que a grande maioria dos reformados recebe e o aumento do custo de vida, atiraram para a miséria milhares de idosos que sobrevivem sem o mínimo de condições de vida ou de dignidade.
Na verdade, são inúmeros os relatos de idosos que vivem na rua, cujo número aumentou significativamente nos últimos dois anos, que são abandonados em hospitais ou que vivem sozinhos e em situações muito precárias sem que haja uma rede pública de contacto e combate a esta grave forma de exclusão social.
4. Também na habitação social se registam graves insuficiências, quer no número de fogos existentes, quer nas condições de habitabilidade em que muitas das habitações se encontram. Na verdade, face a situação de crise social que o distrito do Porto enfrenta, a habitação social assume uma cada vez maior importância. A actual situação exige uma forte intervenção e investimento estatal na construção de mais habitação social e na requalificação dos fogos degradados, em apoio e articulação com planos e projectos municipais existentes ou a criar.
Concluído, apenas formalmente, o Programa PER (de erradicação das barracas) só a cegueira política tem permitido, de forma quase generalizada, esconder ou limitar o conhecimento público da existência continuada de graves e muito relevantes lacunas habitacionais na população do distrito, com particular incidência nas zonas de maior concentração humana. Por um lado continua a haver enormes carências da habitação digna para milhares de famílias que, na esmagadora maioria dos casos, não têm hoje qualquer resposta significativa ao nível da construção de novos empreendimentos de habitação social. Por outro lado existe um vasto património de empreendimentos habitacionais de natureza social que se encontra muito degradado e que necessita urgentemente de ser recuperado e qualificado. Finalmente, a degradação acentuada da situação económica e social de milhares de famílias impõe alterações significativas ao nível das fórmulas de determinação dos valores dos arrendamentos que tenham em conta a real situação social dos agregados familiares.
5. No que diz respeito aos dados do rendimento social de inserção, prestação de emergência social que visa intervir em cenários de pobreza extrema, também no distrito do Porto se verificam os dados mais preocupantes. Esta prestação social pressupõe um plano de inserção social que tem como objectivo combater a pobreza e a exclusão social, sendo um importante instrumento para avaliar o nível de pobreza mas também de combate a esta realidade.
No mês de Dezembro de 2007 o distrito do Porto tinha mais de 40 mil famílias a receber esta prestação social. O segundo distrito com mais famílias a receber o RSI era Lisboa com cerca de 14 mil famílias, isto num universo de 111 mil famílias que recebem esta prestação a nível nacional.
Se analisarmos os dados do Rendimento Social de Inserção por famílias e respectivos escalões de rendimentos ou pelo montante da prestação, constatamos que o distrito do Porto lidera em todos os patamares de análise.
Se tivermos em conta, não as famílias, mas o número de beneficiários, constatamos que no distrito do Porto existem 103 mil beneficiários, em Lisboa 40 mil e Braga cerca de 19 mil. Assim, de um total de 311 mil beneficiários do RSI cerca de 1/3 destes residem no distrito do Porto.
Registam-se no distrito do Porto, bem como no resto do país, inaceitáveis atrasos na atribuição desta prestação, incompatíveis com o seu cariz de emergência, que decorrem da desresponsabilização do Estado, pelo que importa que o Governo tome medidas e assuma as suas responsabilidades na gestão e atribuição dos apoios do Rendimento Social de Inserção bem como pela elaboração e concretização dos planos de inserção, através do reforço dos meios técnicos e humanos da Segurança Social.
A pobreza, desemprego, precariedade e exclusão social que afectam a população do distrito do Porto têm também especial incidência nas mulheres que são o maior número de desempregadas, de beneficiárias do rendimento social de inserção, que recebem os salários mais baixos (mesmo para trabalho igual) e é sobre elas que ainda recai, decorrente da divisão tradicional dos papéis familiares, a responsabilidade com as crianças e com os idosos. Num momento em que o Governo propagandeia a igualdade de oportunidades, as suas políticas demonstram a sua contradição no aprofundamento das desigualdades existentes em função do sexo.
Fica assim demonstrada a necessidade de criar um plano de emergência social para o distrito do Porto que vise mitigar as consequências nefastas das opções das politicas de direita, levadas a cabo ora pelo PS ora pelo PSD com ou sem CDS.
Assim, a Assembleia da República, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa, resolve recomendar ao Governo:
- A criação de um Observatório da Pobreza e Exclusão Social no Distrito do Porto, para recolha e análise de dados, estude as causas, consequências e proponha medidas de combate à pobreza e exclusão social neste distrito.
- O aumento do investimento público por forma a:
a)Permitir dotar o distrito das infra-estruturas capazes de aumentar a competitividade económica e a qualidade de vida da população;
b)Aumentar e qualificar a resposta dos serviços públicos, em especial na área da saúde, da educação e na formação dos recursos humanos, na segurança social, na justiça e na segurança das populações;
c)Apoiar a rede de micro, pequenas e médias empresas do distrito, a sua modernização e qualificação;
d)Aumentar a qualificação e a formação de recursos humanos tendo em conta as especificidades e necessidades do tecido produtivo;
e)Criar condições para inverter a crise social e económica que o Distrito do Porto vive e permitir, de uma forma sustentada, combater os elevados níveis de desemprego que se registam no distrito.
- O combate firme à precariedade laboral e a Implementação um Plano de Criação de Emprego com direitos no distrito do Porto.
- A implementação de uma rede pública, dotada dos suficientes recursos humanos e materiais, de combate à pobreza e exclusão social, incidindo particularmente sobre a população idosa e infantil.
- O investimento na rede pública de equipamentos sociais, nomeadamente nas valências de lares, centros de dia, creches e jardins-de-infância, de qualidade e a preços acessíveis.
- A adequação de critérios e a eventual redefinição de prioridades para que o QREN possa participar de forma central no reforço do investimento público no distrito, permitindo igualmente uma utilização clara de meios financeiros na superação da situação de emergência social, em especial na construção dos equipamentos sociais referidos no item anterior.
- A criação de mecanismos de concertação social no plano distrital que viabilizem a definição de objectivos específicos tendentes a promover a elevação dos salários e o aumento do poder de compra por forma a que seja possível alcançar uma equiparação aos valores médios nacionais.
- Reforço da rede pública de cuidados primários de saúde nas zonas e bairros mais carenciados do distrito do Porto, bem como o alargamento da rede pública de cuidados domiciliários, cuidados continuados e criação de um programa que promova o acesso a cuidados de saúde oral.
- Criação de um programa integrado para a avaliação e superação das necessidades de habitação social no distrito, em articulação com as Autarquias Locais, com as seguintes componentes:
a)Participação financeira na construção de novos empreendimentos de habitação social com equipamentos sociais e adequadas condições de inserção social e urbanística;
b)Participação financeira no apoio directo e indirecto à recuperação do parque habitacional social, incluindo a sua recuperação e qualificação social e urbanística;
c)Alteração do quadro legislativo de fixação do valor das rendas que passe a ter em atenção a real situação social das famílias.
- O reforço dos meios humanos e materiais das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em risco do distrito do Porto.
- A centralização do processo de atribuição e gestão do Rendimento Social de Inserção na Segurança Social, dotando-a de meios técnicos e humanos, garantindo a redução do tempo de espera para a atribuição desta prestação social e a aplicação do plano de inserção social a todos os beneficiários desta prestação.
Assembleia da República, 14 de Março de 2008
Os Deputados do PCP